sexta-feira, 14 de agosto de 2009

As cores em "O Vermelho e o Negro", de Stendhal

Tenho a impressão de que muitos leitores de O Vermelho e o Negro nunca chegaram a descobrir a razão deste título. Resolvi falar um pouco sobre isso.
Julian Sorel, protagonista desta obra de Stendhal, media os progressos de sua vida comparando os passos que trilhava com os de Napoleão Bonaparte, seu ídolo inspirador. Possuía até mesmo um retrato de Napoleão ao lado de sua cama. Se o famoso militar francês elevara-se ao posto de general aos dezoito anos, Julian impunha a si mesmo imitar-lhe a grandeza dos feitos e também os prazos com os quais os realizara. Afinal, seu sonho era encarnar o heroísmo e a fama quase mitológica de Napoleão.
Não é preciso observar o quão prepotente era o jovem Sorel. Hoje em dia, nós o encaminharíamos ao terapeuta; e quem leu O Vermelho e o Negro deve se lembrar dos atritos familiares que Julian sofria com freqüência. De qualquer forma, isso tudo não explica o título da obra – o que eu me propus a fazer.
Falemos, então do vermelho. Já há séculos, a cor vermelha tem sido a cor da revolução. Ela representa o conjunto de idéias críticas e inovadoras, muito mais do que simplesmente uma política de esquerda, e que conduz a atitudes pujantes e agressivas (lembrando que o comunismo, pelo menos como nós o conhecemos, não existia naquela época). No tempo a que me refiro, o vermelho era a cor da Revolução Francesa assim como a do Império Napoleônico.
Nos dias em que transcorre esse romance de Stendhal, o Império Napoleônico já havia caído, e a velha instituição monárquica da França (a mesma que tinha vigência antes da Revolução) havia retornado ao poder no país. Ou seja: o tempo dos revolucionários havia passado, e reinava a ideologia conservadora, subordinada à monarquia. Gostar de Napoleão, então, tornou-se de péssimo tom. Quem demonstrasse suas tendências revolucionárias teria sérias dificuldades em manter seus contatos sociais.
E é aí que chegamos no ponto central de O Vermelho e o Negro: a dissimulação de Julian Sorel. A fim de ascender socialmente, o jovem esconde suas verdadeiras idéias sobre a vida a fim de adaptar-se ao meio social. Ele chega a tornar-se padre, recebendo assim as graças e condecorações de seus superiores, ainda que seus ideais fossem inteiramente opostos à vida devota. Utilizando-se dessas táticas, Julian emerge de uma origem pobre e alcança os altos salões da aristocracia francesa. Não irei me dedicar aqui a comentar as suas táticas dissimulatórias com o sexo feminino – pois esse assunto renderia comentários o suficiente para outra postagem.
Assim, se o vermelho é a cor da revolução, dos ideais ousados e obstinados, a cor preta representa o conservadorismo; é a cor da batina – possível símbolo da instituição mais conservadora da História. Julian Sorel é uma contradição, assim como todo cafajeste: ele tem, em si, o vermelho e o negro, nitidamente opostos, mas que convivem por um objetivo maior: o seu triunfo na vida.
Agora, se ele chegou a triunfar... bem, para isso é preciso ler o livro. Não irei estragar o final! Provavelmente, o desfecho de O Vermelho e o Negro é o único momento onde Julian vive, realmente, o seu lado revolucionário – da pior forma possível.


por Paul Irineu


Biografia de Stendhal
Stendhal (1783-1842) - Pseudônimo de Marie-Henri Beyle
Stendhal nasceu com o nome de Marie-Henri Beyle, em Grenoble, um distrito da França, que ele odiava. Seu estilo valorizava o perfil psicológico dos personagens, a interpretação de seus atos, sentimentos e paixões. Utilizou pela primeira vez o pseudônimo de Stendhal no ensaio “Roma, Nápoles e Florença”, em 1817.
Foi um dos mais originais escritores franceses da primeira metade do século 19, e desempenhou um papel importante no desenvolvimento do romance moderno.

Stendhal é mais conhecido pelas suas obras Le Rouge et Le Noir (O Vermelho e o Negro), de 1830 e La Chartreuse de Parme (A Cartuxa de Parma), de 1839. Escreveu também livros de viagem, literatura, crítica de arte e biografias sobre compositores como W. A. Mozart e Joseph Haydn. Os temas de Stendhal são freqüentemente melodramáticos, embora formem um quadro fascinante para suas histórias psicologicamente profundas que tratam sobre o egoísmo e caminhos diferentes para a auto-descoberta.

Stendhal declarou, certa vez, que não considerava morrer na rua algo indigno e, ironicamente, faleceu de um ataque de apoplexia, na rua, aos 59 anos, sem concluir sua última obra, Lamiel, que foi publicada muito depois de sua morte.

Algumas frases de Stendhal:


Sobre Amor:

“O amor é uma bela flor à beira de um precipício. É necessário ter muita coragem para a ir colher.”

“O homem que não amou apaixonadamente, ignora a metade mais formosa da existência.”

“O que é um amante? Um instrumento no qual nos esfregamos para ter prazer.”

“O que torna a dor do ciúme tão aguda é que a vaidade não pode ajudar-nos a suportá-la.”

“Para um amante, acabaram-se os amigos.”

"As mulheres muitíssimo belas surpreendem menos no dia seguinte."

“Só temos coragem para com os que amamos amando-os menos.”

“As alegrias do amor são sempre proporcionais ao medo de as perdermos.”

"O amor é como a febre, nasce e extingue-se sem que a vontade tome minimamente parte nele."

“Só existe uma lei no amor; tornar feliz a quem se ama.”


Sobre Religião:

“O que desculpa Deus é o fato de Ele não existir.”

“Todas as religiões são fundadas sobre o temor de muitos e a esperteza de poucos.”

“A Bíblia é um livro para ser acreditado pelo cego e não discutido.”


Sobre o Ser Humano:

“A maior felicidade que pode acontecer a um grande homem é ele, cem anos após a sua morte, ainda ter inimigos.”

“A velhice, essa época em que se julga a vida e em que os prazeres do orgulho se revelam em toda a sua miséria (...).”

“Nada paralisa mais a imaginação que o apelo à memória.”

“Tudo se pode adquirir na solidão, salvo o caráter.”

“Quanto mais forte é um caráter, menos sujeito está à inconstância.”

“A presença do perigo confere gênio ao homem sensato.”

“Podemos conhecer tudo, salvo a nós próprios.”

“Investe-se maior paixão para obter o que se não tem, do que para conservar o que já se tem.”

“É difícil não exagerar a felicidade que não se goza.”

“Uma coleção de baionetas ou de guilhotinas é tão incapaz de deter uma opinião como uma coleção de moedas de ouro é incapaz de deter a gota.”

"A palavra foi dada ao homem para esconder o seu pensamento."

"O ideal é um poderoso bálsamo que duplica a força dos homens de gênio e mata os fracos."

"Perceber os defeitos dos outros será um talento?"

"Ter firmeza de caráter é havermos sofrido o efeito dos outros sobre nós próprios."

"O medo nunca está no perigo, mas em nós."

"Os homens só se compreendem uns aos outros na medida em que os animam as mesmas paixões."

"Chamo caráter de um homem à sua maneira habitual de ir à caça da felicidade."

"A verdadeira pátria é aquela onde encontramos o maior número de pessoas que se parecem conosco."


Sobre outros assuntos:

"Quando se está preso, o pior é não poder fechar-se a porta."

"As pessoas que reverenciamos não passam de velhacos que tiveram a felicidade de não serem apanhadas em flagrante delito."

"O aborrecimento tira-nos tudo, até a coragem de nos matarmos."
"Dar nome a uma doença é apressar-lhe os avanços."

Pesquisa por Ana Tedesco


Links para exemplares à venda de “O Vermelho e o Negro”



2 comentários:

  1. A minha interpretação é diferente: o preto representa Julien Sorel, (expressa nas suas vestes) sua frieza e pragmatismo (que são intercalados com momentos de paixão e impulsividade). E o vermelho Madame de Renal, que cora na presença dele; representa o pecado (pelo qual ela se culpa), e o amor incontrolável que ela sente por ele.

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  2. Adorei seu post, me ajudou muitíssimo a fazer uma resenha no meu blog. Até citei você!
    Se quiser dar uma passada: www.umolhardeestrangeiro.blogspot.com

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